Com safra recorde,
silos-bolsa e piscinões se multiplicam no campo
Recebedoras de 55% da safra gaúcha de soja, cerealistas
buscam alternativas para dar conta do volume histórico de grãos
Por: Joana Colussi
Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Com uma supersafra de soja se confirmando e mais de 30% da
capacidade estática comprometida com estoques de trigo e de milho, a Cereais
Werlang, de Ibirubá, localizada no noroeste do Estado, teve de agir rápido. Em
março, às vésperas da colheita, a empresa iniciou uma força-tarefa para abrir
espaço nos silos ocupados.
— Buscamos mercado para uma parte da produção estocada e o
restante colocamos em silos-bolsa — conta Clóvis Werlang, diretor-proprietário
da empresa.
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Werlang admite que esta não é a melhor opção, pois além de
representar custo extra, é menos segura do que os armazéns convencionais:
— O ideal era ter silo metálico para receber toda a safra.
Acaba sendo um quebra-galho para não deixar de atender o produtor — explica,
esclarecendo que, assim que for aberto espaço nas unidades, as bolsas serão
descartadas.
A capacidade estática da empresa, de 60 mil toneladas, foi
ampliada em 10% com a ajuda de pouco mais de 30 estruturas plásticas. Outras 15
mil toneladas foram estocadas em unidade da Companhia Estadual de Silos e
Armazéns (Cesa), arrendada pela cerealista de Ibirubá.
Em Ibirubá, Clóvis Werlang (à direita) adotou estruturas
emergenciais na cerealistaFoto: Fernando
Gomes / Agencia RBS
Na vizinha Grandespe, com sede em Tapera, no Norte, o volume
de soja até o final da colheita deverá chegar a 150 mil toneladas — o dobro da
capacidade estática. Para não deixar de receber o produto, a empresa buscou
unidades de parceiros na região, adaptou armazéns e apressou a saída de
caminhões para o porto de Rio Grande, onde cargas de soja não vendidas ficam
depositadas em armazéns de tradings — que atuam como intermediárias entre
produtores e compradores —à espera de negócios.
— O maior custo é a expedição. O frete praticamente dobra de
preço em razão da grande oferta de produto e a pouca disponibilidade de
caminhões. Isso acaba prejudicando a receita das empresas e dos produtores —
avalia Zeno Valentin Batistella, gerente comercial da Grandespe.
De Tapera a Rio Grande, em percurso de 550 quilômetros, o
preço da tonelada passa de R$ 100. Em períodos fora da safra, o valor médio é
de R$ 65 por tonelada. Nesta ano, a estimativa é de que as cerealistas recebam
55% da soja gaúcha.
— E mesmo assim somos discriminadas pelo governo — reclama
Batistella.
eno Batistella, da Grandespe, reclama da falta de créditoFoto:
Fernando Gomes / Agencia RBS
A queixa refere-se à diferença nas linhas de crédito
oferecidas ao setor na comparação com cooperativas. Desde o final de 2015, as
cerealistas não puderem mais acessar financiamento por meio do Programa para
Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), do governo federal.
— Nossa opção é crédito com juro mais alto e que cobre
apenas 50% do investimento, o que dificulta muito a ampliação de silos —
confirma Vicente Barbiero, presidente da Associação das Empresas Cerealistas do
Rio Grande do Sul (Acergs).
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Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Piscinões a céu aberto
A face mais crítica no armazenamento da supersafra no Rio
Grande do Sul é vista em piscinões a céu aberto, onde a soja é depositada no
chão e coberta com uma lona. Na Cooperativa Agropecuária Júlio de Castilhos
(Cotrijuc), na região Central, a medida começou a ser tomada quando a
cooperativa recebeu pouco mais de 50% do volume projetado até o final da safra
— 480 mil toneladas. Nas 12 unidades, a Cotrijuc tem capacidade para estocar
210 mil toneladas, incluindo 35 mil toneladas da estrutura da Cesa.
— Fizemos investimentos nos últimos anos, mesmo assim não
conseguimos acompanhar o crescimento da produção no campo — justifica Luiz
Cesar Moro, gerente comercial e operacional de grãos da Cotrijuc.
Primeiro piscinão de soja a céu aberto da Cotrijuc chegou a
receber 260 caminhões em apenas um dia Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
O primeiro piscinão de soja a céu aberto foi feito ao lado
da sede da cooperativa, que chegou a receber 260 caminhões em apenas um dia. Em
uma semana, 3,5 mil toneladas foram depositadas no local. Estruturas como essa
também foram montadas em outras unidades de recebimento. Os riscos da medida
são minimizados pela Cotrijuc:
— O importante é não deixar entrar água por baixo —
argumenta Moro, justificando que a solução é mais barata do que armazenar em
silos-bolsa.
Presidente da Cotrijuc, Caio Vianna admite que o ideal seria
que a cooperativa ampliasse a capacidade para pelo menos 70% da produção
recebida.
—Safra não deve permanecer dentro de armazém. Infelizmente,
tivemos uma conjunção de fatores que levou o produto a ficar parado neste
momento — avalia Vianna, lembrando que muitos produtores perderam a
oportunidade de vender a produção antecipada quando os preços estavam melhores.
Depósitos adaptados para receber grãos
Com 3,8 mil agricultores associados, e produtividade acima
da média estadual, a Cotripal Agropecuária Cooperativa, de Panambi, sabia que
essa seria uma safra atípica. A cooperativa, que começou a safra com 20% da
capacidade comprometida com trigo e milho, tratou de esvaziar os armazéns que
serviam como depósitos de fertilizantes e defensivos logo que a colheita de
soja começou na região Noroeste.
— Conseguimos ampliar em 100 mil toneladas a nossa
capacidade, que é de 400 mil toneladas, resolvendo o nosso déficit nesta safra
— detalha Ronaldo Ernesto Müller, gerente de armazenagem da cooperativa.
Nos armazéns de fundo plano, diferente da estrutura
tradicional de silos metálicos, a temperatura e a umidade não são controladas.
— É uma medida emergencial, que acaba aumentando nossos
custos operacionais por um período específico — diz Müller.
Apesar de considerar o déficit da armazenagem um
"problema bom", diante de uma supersafra de grãos, o presidente da
Federação das Cooperativas Agropecuárias do Rio Grande do Sul (Fecoagro), Paulo
Pires, afirma que as dificuldades poderiam ter sido evitadas se os mecanismos
de comercialização do trigo tivessem vindo antes:
— Tínhamos muito estoque da safra passada, até mesmo soja, o
que agravou o quadro agora.
Armazéns de insumos serviram para o grão, conta Ronaldo
Müller, gerente de armazenagem da CotripalFoto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Falta de crédito freia investimentos
O déficit na armazenagem evidenciado com a colheita de grãos
é resultado da redução do ritmo de investimentos nos últimos anos — fruto da
escassez de crédito destinado ao setor. Em 2013, quando o Programa para
Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) foi lançado, a promessa do governo
federal era liberar R$ 5 bilhões ao ano para financiamento até 2017. Nos dois
primeiros anos, o planejamento foi cumprido. A partir de 2015, o volume foi
reprogramado, o juro aumentou e os investimentos passaram a minguar.
Na safra atual, o governo disponibilizou R$ 1,4 bilhão para
o PCA e até fevereiro o volume acessado não passava de R$ 400 milhões — 10
vezes menos do que a projeção inicial do programa.
— Os bancos estão com bastante precaução para liberar
empréstimos. Os investimentos ficaram muito escassos — lamenta Tadeu Vino,
superintendente comercial da Kepler Weber, maior fabricante de silos na América
Latina.
Com fábrica em Panambi, no noroeste do Estado, a empresa
chegou a ter lista de espera para entrega de silos em 2014, quando empregava
2,5 mil pessoas. Atualmente, tem 1,5 mil funcionários e aguarda a retomada do
mercado após uma safra cheia marcada por problemas de logística em todo o país.
— Mas para isso acontecer é preciso crédito. É um
investimento alto, com retorno a médio e longo prazo, por isso o financiamento
precisa ser atrativo — completa Vino, acrescentando que a armazenagem é um
setor estratégico que precisa ser mais valorizado pelo governo federal.
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TOMADO DE ZERO HORA DE RGS BR
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